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A solidão é associada
constante e equivocadamente com algo ruim e recebe uma conotação negativa. Como
se fosse um carma, uma praga ou castigo. Eu, particularmente, acho isso um
desperdício, posto que muitas coisas boas em minha vida, muitas decisões
acertadas, por exemplo, aconteceram depois de momentos decisivos de solidão
produtiva e reflexiva.
Rubem Alves, numa crônica publicada
no Correio popular em 2002 disse uma coisa fantástica, ele abordou com a
maestria que sempre lhe foi peculiar um tema tão delicado e nessa obra ele decretou:
“Sua tristeza não vem da solidão, ela vem das fantasias que surgem na solidão.”
E ele tem toda razão! Se formos analisar o cerne da questão, veremos que ele está
certíssimo. Nós é que a demonizamos.
Na solidão, a tristeza não
vem do fato de estarmos sós. Ela deriva do pensamento de que se estivéssemos em
tal lugar com tal pessoa estaríamos melhor do que estamos agora. A gente roda,
roda, mas sempre esbarra na sombra do “e se...” “e se tivéssemos feito assim e
não assado?” “se tivéssemos escolhido aquele caminho e não esse, onde
estaríamos agora?” são essas indagações e devaneios que nos torturam.
Imagine a cena: você chega em casa depois de
um longo dia de trabalho, mas a sua casa está completamente ás escuras, não tem
ninguém esperando. Tudo breu. Tudo silêncio. Você não tem com quem conversar,
liga a TV, mas nem presta atenção no que ta passando, o que você quer mesmo é
pôr fim ao silêncio. Daí até a hora de
dormir é uma sequência de afazeres automáticos porque no dia seguinte começa
tudo de novo e a noite é sempre mais difícil. Você acha isso ruim?
Na verdade, o problema não
está no fato de estar só, o problema está no modo como você encara essa
situação. O Padre Fábio de Melo em seu livro “Quem me Roubou de mim” fala sobre
o sequestro da subjetividade, sobre o cárcere que impomos a nós mesmo em função
do outro, e mais ainda, sobre o poder que o outro exerce sobre nós quando assim
permitimos. Esse livro é fantástico para que conheçamos a nós mesmos e
identifiquemos quais os tipos de pessoas queremos em nossas vidas.
Trazendo experiências desse
livro para o texto, é possível fazer associação entre o sequestro da subjetividade
e a solidão. Você está só quando foge de si, quando abandona sua personalidade,
quando se esvazia de si mesmo e se enche de um personagem criado para
satisfazer os anseios da outra pessoa. Você está só quando se anula, quando se
isola, quando se recusa a se aceitar. A solidão, ao contrário do que imaginamos,
pode ser infinitamente mais ampla.
Diferentemente do que pensamos,
é na solidão que encontramos respostas para inúmeras perguntas, apenas estando
sozinhos, longe dos risos bobos e das conversas vazias, desfrutando da nossa
própria companhia é que poderemos nos conhecer melhor. Longe da paquera, do
papo vazio e superficial de uma balada lotada de sábado à noite. Da pegação efêmera
e momentânea. São nesses momentos, solitários e reflexivos, que “a ficha cai”.
Existem vários tipos de
solidão e para todas elas há sempre um ponto positivo. Basta saber ver. Querer
ver. É necessário que tenhamos consciência do que, de fato, o ‘estar só’
representa pra nós. Se você o encara como uma benção ele há de ser, mas se você
o vê como maldição não haverá como ser diferente.
Um efeito avassalador é da
solidão Espiritual. Respeito e muito quem não acredita na força e no agir de
Deus. Mas, não creio na possibilidade de uma vida plena sem a orientação,
proteção e amparo Divino. Quando você sente os efeitos da solidão social você
liga pra um amigo, vai visitar um parente, vai naquela festinha que acha super
chata, mas, como está se sentindo sozinho, vai assim mesmo. E quando a solitude
é dentro de você? Quando nada preenche esse vazio? Não importa aonde você vá,
não importa o que faça, a angústia continua ali, aquela lacuna irreparável. É a
falta de Deus. Acredite!
Existe a solidão
acompanhada. Aquela tortura de amar e não ser amado. Aquela angústia de ofertar
afeto e receber desprezo, aquele desassossego de não saber onde a pessoa está,
mesmo ela estando, fisicamente, ali do seu lado. Quem ama ou já amou alguma vez
na vida entende que é a distância que aproxima. É, basicamente, na ausência que
a proximidade é maior. Talvez a melhor forma de remediar a situação, se isso
ainda for possível, seja o distanciamento.
Existe ainda a dor de ser
uma ilha. Estar só em meio a um mar de gente. Saber que mesmo estando cercado
de pessoas por todos os lados nenhuma daquelas pessoas ali estão preocupadas
com você ou solidárias a sua dor. Ou, podem até estar preocupadas, mas não
conseguem te alcançar. Por ser uma ilha, você não é tão acessível.
A beleza da vida reside nos
desenhos que se formam dos pequenos fragmentos que se unem conforme as coisas
vão mudando. São esses fragmentos que dão cor, forma e sabor a nossa existência.
São essas minúcias que fazem nossos dias valerem à pena. Como disse Guimarães
Rosa: “Felicidade se acha é em horinhas de descuido.” Nos descuidemos então.
Muitas vezes nossa busca
desenfreada por uma companhia que nos livre da solidão, nos impede de ver a
beleza que a vida está nos ofertando de forma voluntária e gratuita. Pensemos.