quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Passado, Presente e Futuro



Houve um tempo em que o passado era presente e com ele eu planejava um futuro, mas o passado-presente mudou os planos e o futuro não chegou. O Passado que era presente ficou, definitivamente, no passado.

A vida seguiu seu rumo, o tempo passou, e conseguimos aprender as lições que a vida nos dá. O que um dia foi muito importante hoje já não é mais tão importante assim e amanhã, certamente, nem será mais lembrado. A gente vive, anda, cai, chora, limpa-se, levanta-se, sorri e continua andando...

O passado que lá ficou percebeu que fez a escolha errada e agora tenta se redimir. Tenta de todas as maneiras reconquistar o espaço que um dia foi dele, mas o tempo passou, nosso tempo passou. Os planos mudaram, as ideias mudaram, as estações mudaram e os meus objetivos agora são outros.

Inconformado, o passado não desiste e continua tentando, tentando, tentado... Mostra o presente, planeja o futuro e mais uma vez, faz inúmeras promessas... "Água mole em pedra dura, tanto bate..." ... que um dia consegue abalar uma certeza até então, aparentemente, inabalável e a dúvida surge:
O que fazer quando o passado, que já foi seu presente, e pretendia ser o futuro, mas mudou de ideia, volta arrependido oferecendo um futuro diferente, mais centrado, mais plantado, mais consistente?

O que fazer quando o passado insiste em voltar ao presente e virar futuro?

O passado é o mesmo, as circunstâncias são as mesmas, os personagens são os mesmos e o final dessa história a gente já conhece. Para quê começar tudo de novo se sabemos onde isso vai terminar?

Promessas são só promessas. O que você chama de consistente eu chamo de abstrato. O que você alega ser plantado eu julgo superficial o que você afirma ser centrado eu vejo disperso.

E sabendo de tudo isso, não me conformo que minha cabeça ainda esteja tão confusa. Se eu já tenho uma ideia formada, como posso, mesmo depois de tudo, estar indecisa?

Quem foi que disse que a vida é simples?

Mais uma vez cito Guimarães Rosa: "Viver é etecetera..."

Verônica

3 comentários:

Válter Moisés disse...

Resíduo
Carlos Drummond de Andrade

De tudo ficou um pouco.
Do meu medo. Do teu asco.
Dos gritos gagos. Da rosa
ficou um pouco.

Ficou um pouco de luz
captada no chapéu.
Nos olhos do rufião
de ternura ficou um pouco
(muito pouco).

Pouco ficou deste pó
de que teu branco sapato
se cobriu. Ficaram poucas
roupas, poucos véus rotos,
pouco, pouco, muito pouco.

Mas de tudo fica um pouco.
Da ponte bombardeada,
de duas folhas de grama,
do maço
– vazio – de cigarros, ficou um pouco.

Pois de tudo fica um pouco.
Fica um pouco do teu queixo
no queixo de tua filha.
De teu áspero silêncio
um pouco ficou, um pouco
nos muros zangados,
nas folhas, mudas, que sobem.

Ficou um pouco de tudo
nos pires de porcelana,
dragão partido, flor branca,
ficou um pouco
de ruga na vossa testa,
retrato.

Se de tudo fica um pouco,
mas por que não ficaria
um pouco de mim? no trem
que leva ao norte, no barco,
nos anúncios de jornal,
um pouco de mim em Londres,
um pouco de mim algures?
na consoante?
no poço?

Um pouco fica oscilando
na embocadura dos rios
e os peixes não o evitam,
um pouco: não está nos livros.
De tudo fica um pouco.
Não muito: de uma torneira
pinga esta gota absurda,
meio sal e meio álcool,
salta esta perna de rã,
este vidro de relógio
partido em mil esperanças,
este pescoço de cisne,
este segredo infantil...
De tudo fica um pouco:
de mim; de ti; de Abelardo.
Cabelo na minha manga,
de tudo ficou um pouco;
vento nas orelhas minhas,
simplório arroto, gemido
de víscera inconformada,
e minúsculos artefatos:
campânula, alvéolo, cápsula
de revólver... de aspirina.
De tudo ficou um pouco.

E de tudo fica um pouco.
Oh abre os vidros de loção
e abafa
o insuportável mau cheiro da memória.

Mas de tudo, terrível, fica um pouco.
e sob as ondas ritmadas
e sob as nuvens e os ventos
e sob as pontes e sob os túneis
e sob as labaredas e sob o sarcasmo
e sob a gosma e sob o vômito
e sob o soluço do cárcere, o esquecido
e sob os espetáculos e sob a morte de escarlate
e sob as bibliotecas, os asilos, as igrejas triunfantes
e sob tu mesmo e sob teus pés já duros
e sob os gonzos da família e da classe,
fica sempre um pouco de tudo.
Às vezes um botão. Às vezes um rato.

O Divã Dellas disse...

Que lindo, Válter!

Entendi a mensagem... Certamente ficaram resíduos.

Volte sempre! O Divã é seu!

Beijos

Verônica

Jussara disse...

Ih, Vê! Esse passado está mais presente que tudo... Deixa de ser boba menina! Se joga!

Válter, que poema lindo!

Esse Divã está se superando. Cada dia mais lindo, rico em informação e cultura.

Adoro isso tudo!