quarta-feira, 5 de outubro de 2016

A Corrupção Nossa De Cada Dia


(by Cinthya)

Fazendo um trabalho da faculdade, precisei pesquisar de foma muito prazerosa, diga-se de passagem, alguns amigos filósofos sobre um conceito que, embora tenha se mostrado atemporal, ainda se faz difícil de ser internalizado ao ponto de ser incorporado nas práticas nossas de cada dia. Refiro-me à Ética.

Muitos diriam que o momento é bem oportuno para discutir tal assunto, mas eu consertaria a frase dizendo que todos os momentos são oportunos para discutirmos esse assunto. Que não somente a atual novela política brasileira, não somente o governo ilegítimo que temos, não somente como as coisas se deram, não somente as eleições para prefeito e suas histórias cabulosas. Não. Não é só isso.

Sempre que falamos em Ética, voltamos de imediato o nosso olhar e nosso dedo para o outro. Já perceberam? Sempre que mencionamos ou apenas pensamos em ética, já nasce em nós o julgamento da postura de alguém. Já pensamos naquele político (em primeiro plano), pensamos naquele religioso (em segundo plano), pensamos naquele traficante (em terceiro plano) e, embora não necessariamente nessa ordem, sempre pensamos em outrem e nunca em nós mesmos, como se não estivéssemos sob esse julgamento.

E talvez seja por isso que, por tantas vezes, nos deparamos com cenas contraditórias onde uma pessoa que faz “gato” de energia em casa sai nas ruas para chamar o governo ou determinado partido de corrupto. Uma pessoa que oferece cesta básica a outra em troca de voto  ou favor político (e inclue-se também quem recebe a cesta básica)não poderia sequer “olhar torto” para quem usurpa lá no poder maior.

Sabe aquela vez que estacionamos na vaga pra deficiente? Sabe aquela vez que chegamos no banco e a fila estava imensa e então descobrimos aquele colega de faculdade que está prestes a ser atendido e pedimos para ele pagar o nosso boleto? Sabe aquela vez que nós votamos num candidato por que ele nos ofereceu um emprego? Sabe aquele troco errado que o caixa do supermercado nos deu a mais e que nós não devolvemos, pois “não roubei. 
Ele que me entregou”? Lembra daquela “roubadinha” que damos na contramão para ganhar uns minutos de tempo? Sabe todas as vezes que colamos descaradamente (e outras vezes bem profissionalmente, convenhamos) nas provas? Sabe quando pagamos para alguém fazer nosso trabalho de faculdade porque estamos sem tempo pra pesquisar? Sabe aquela vez que a compra feita via internet veio em duplicidade e nós, por escolha, ficamos com as duas sem nem tentar devolver? Sabe quando trocamos o santinho do eleitor analfabeto para que ele vote no nosso candidato? Sabe quando a gente faz uso de bebida alcoólica e vai dirigir? Sabe aquela pequena “coisinha miudinha” que fazemos para benefício próprio e que não está condizendente com a moral?

Esses são alguns dos pequenos exemplos de corrupção que nós cometemos no nosso dia a dia. São atos que já estão quase que no automático, nem percebemos mais. Já fazemos como se fosse normal. Mas não é. Mas não são. São atos despidos de moral, assim sendo, não são éticos. Não ajudam a coletividade a viver bem.  Não é difícil percebermos o quanto colocamos nossos interesses pessoais à frente de nossas ações. E isso é a contra mão da ética.

Então eu entendo (e isso é um ponto de vista meu, que fique claro) que se eu me corrompo nas pequenas coisas é porque são nelas que tenho a chance de me corromper hoje. Se coloco meus interesses pessoais à frente das minhas decisões, quando escolho ficar com o troco de R$ 5,00 à mais que o caixa do supermercado me deu (mesmo sabendo que ele irá tirar do seu bolso para repor aquela valor no final do dia), o que me levaria acreditar que eu eu não faria o mesmo diante de R$ 50.000.000,00 dos cofres públicos?

Se não somos todos corruptos, somos (ainda) corruptíveis, ainda não aprendemos a pensar na coletividade antes de pensarmos em nós próprios. Então, pra não pegar mal a gente falar da corrupção alheia sem olhar pra própria postura, como diz aquele ditado “macaco senta no rabo pra falar do outro”, façamos um exercício de autoanálise. É gratuito. É trabalhoso, mas traz benefícios incríveis que vão servir para o nosso bem estar e para o bem estar da coletividade, ou seja, nos transformarão em seres éticos.  

Somos livres (ou ainda, como dizia Sartre, condenados) para fazer as nossas escolhas e somos, de certa forma, o resultado delas. Então, prestemos atenção em nós antes de iniciar o julgamento do outro.

Somos corruptíveis sim, mas somos também perfectíveis. Eu acredito nisso.


Preste atenção nas suas escolhas!

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Alô Crush!



(by Cinthya)

Um dia você cansa de dar com a cara na parede. Eu, particularmente, tenho minhas desconfianças naquela afirmativa de que “os opostos se atraem”. Aliás, eles até se atraem, mas não passa disso. Uma hora as diferenças gritam alto e o barulho incomoda ao ponto de você ir buscar seu silêncio em outros ares. Buscar melodias que se encaixem na sua letra; passos que caibam na sua dança; letras que preencham suas páginas. Não se sustenta uma relação sem harmonia.

Então, todas as suas amigas decidem (entre elas, que isso fique claro) que você precisa de alguém. Não tem condições nenhuma de você ficar só. Não é saudável uma mulher tão inteligente e interessante não encontrar um par. E começam a desenterrar defuntos mumificados ou trazem novidades totalmente fora de seu contexto. E tanto cobram que você começa a pensar que, de fato, pode estar ocorrendo algum problema.

Então você vai recebendo as indicações das amigas e descartando-as uma a uma: “Esse não. Nada a ver!”, “Vixe, deixa quieto”, “Esse é até legal, mas gosta de tudo oposto”, “Com esse tinha química, mas só isso”, enfim. PAREM por favor. Não tem coisa mais insistente do que amigas querendo desencalhar alguém. Elas não cansam. São empenhadas.

Um dia, como num sopro ao seu ouvido, vem o nome daquele Crush. Um sussurro que te faz perder o folego porque vocês têm muita coisa em comum. Mas, você empolga-se pra logo em seguida conter-se, porque apesar de lindo, existem obstáculos consideráveis no caminho. E você começa a observá-lo de forma mais atenciosa, até porque desafios sempre lhe atraem. Inicia-se um processo gostoso de descobrimento. Parece que ele estava coberto com um manto que, de repente, foi retirado. Como você nunca o havia visto com esses olhos de desejo?

Dizem que “gato escaldado tem medo de água fria” e com você, que é gata, não seria diferente. Então você avança quatro passos pra recuar dois. Sempre na espreita, no cuidado. Procura nele uma reciprocidade mínima que seja, mas que exista. Caso contrário, será só mais um nome pra lista das “tentativas”.

Sabe aquela famosa afirmação de que “o universo conspira a favor daquilo que tem que acontecer”?  Pois não é que isso é fato! De repente, você se percebe recebendo sinais de todas as partes. Sinais de que esse interesse não é algo aleatório, sinais de que aquele sussurro no ouvido não foi acaso. Aliás, você descobre que acaso é algo totalmente descartado.

E você acorda pra Jesus e vê que aqueles olhos te olham de forma diferente, olham com palavras, com sentimentos. Olhos com frases presas. Parecem sufocar algo que precisa ser dito. Você estremece e, mesmo assim, se mantem quieta. Pode ser que esteja entendendo errado. Mas aí vem o Universo e manda um outro sinal. Descobre que ele gosta daquele cantor que só você (no seu ciclo de convívio) gostava até então. Que ele gosta daquela música que você canta todo dia, vibrando e achando linda. Que ele leu aquele livro que é o seu preferido. Que ele comunga das mesmas crenças.

Você descobre também que sua mão cabe perfeitamente na mão dele, e que a mão dele tem um calor aconchegante, que você ficaria ali por horas, sem reclamar. Você percebe que a presença dele lhe traz segurança, que o timbre de voz dele faz você acalmar-se. As situações vão trazendo você e ele para uma valsa, um círculo que vai se apertando e cada vez mais vão ficando próximos.

Ainda existem dúvidas? Chega aquele medo de fazer papel de trouxa? Você recua. Mas, os sinais se acentuam. E você se percebe atenta. Percebe-se querendo. Percebe-se receptiva. Descobre que existe algo maior e mais forte. E, apesar das circunstâncias e dificuldades, você sabe que vai acontecer. Onde? Quando? De que forma? Não se tem conhecimento. Você nem tem pressa. O que você sabe é que aquele Crush lhe quer. Você tem convicção e talvez aqueles olhares, aquele calor nas mãos, aqueles sinais... Talvez isso sirva de prova. Talvez.


quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Uma Vida Baseada em "Quantas Curtidas?"



(by Cinthya)

O valor que damos às redes sociais despertou em nós algo que enxergo como sendo negativo e perigoso. A super exposição e a necessidade de buscar aprovação alheia, de despertar a inveja nos outros, de provar a nossa “felicidade” não tem limites. Vale tudo para estar na mídia. Vale até mesmo apostar em relações doentes para ter um status de “relacionamento sério”, como se isso fosse um tipo de certificado de qualidade que a gente expõe cheio de orgulho.

E percebo então que o importante não é satisfazer uma necessidade minha, um sonho, um desejo, uma vontade de construir um relacionamento embasado no companheirismo, na afinidade, no respeito, no amor. Não, não é isso. O que importa é que as pessoas vejam que eu tenho alguém, que encontrei um par, que não estou sozinha, que terei companhia para as selfies. Aliás, minhas selfies agora estão completas. Sempre sonhei com selfies completas.

Quantas curtidas? Quantos comentários? Quanta inveja despertarei nas “inimigas”? Afinal, eu tenho alguém. E ele é o “boy magia” do memento, a “coca-cola mais gelada do freezer da humaninde” (como diz meu professor de Antropologia), ele é o “Crush” (ainda dou risada com esse novo termo) que todas sonham ter. Mas ele é meu.

Então, se passamos uma hora juntos, dessa uma hora pelo menos 30 minutos são dedicados às nossas selfies, pois, preciso postar minha felicidade, preciso que as pessoas vejam que estou bem, que minha vida está ótima, que problemas não me visitam mais. Penso mesmo que problema é pros fracos, eu vivo é bem.

A academia não é mais um lugar onde vou praticar exercícios. Não. Isso é coisa do passado. A academia serve para desfilar minhas malhas caras, meu tênis importado. A academia também serve para cultivar minhas formas perfeitas, para idolatrar cada centímetro de massa muscular. E, claro, para fazer selfies. Selfies que vão provar por A+ B que além de ter um crush eu também tenho um corpão, e uma malha cara pra caralho. Sou feliz e vou postar mesmo essa felicidade. Quantas curtidas? Quantos comentários?

A viagem que fizemos foi perfeita. Durou pouco, mas tudo foi perfeito. Viagem perfeita, com o par perfeito, no lugar perfeito. NADA deu errado. E, claro, tiramos muitas selfies para comprovar. Acho legal mostrar que tenho um crush, um corpão e que ainda viajamos juntos numa viagem MARAVILHOSA. E que venham as curtidas e que venham os comentários.

E nem falei do trabalho, do orgulho que tenho em ter um emprego dos sonhos. Coisa que muita gente gostaria, mas poucos conseguem. Então, vou fazer selfies aqui também e vou postar para todos verem que eu, além de tudo o que já mencionei, também tenho um emprego que é muito legal. As inimigas piram com o meu sucesso.

Vou levando as coisas dessa forma e um dia me dou conta de que aquele vazio continua lá, porque fotos, roupas, corpão e viagens não preenchem os anseios da alma. Mesmo as quinhentas curtidas e mais de cem comentários não conseguem fazer aquecer o lugar mais profundo de mim, aquele lugar onde eu vou quando deito a cabeça no travesseiro.

Daí eu percebo que tenho vivido uma vida que talvez nem seja minha. Que tudo o que eu faço, faço para dar satisfação aos outros, para mostrar, para expor, para angariar curtidas e aprovação alheia. Que não curto o momento, que não relaxo, que não me permito ser o que eu sou de fato. Estou o tempo todo procurando provar para os outros que gozo de uma felicidade que, na verdade, não existe. É uma farsa. É uma ilusão. E isso é muito perigoso, isso nos torna pessoas artificiais, que levam uma vida que não é sua, que não se conhecem profundamente, que não criam laços sinceros, que não enxergam nada além de seu próprio umbigo. Nos tornamos individualistas, egoístas e com a falsa ideia de sermos perfeitos, numa vida perfeita.

Quando a realidade bater à nossa porta (e isso vai acontecer) a gente acorda e se deprime, porque nada do que assumimos como nosso, de fato, é nosso. Por que eu preciso tanto que os outros vejam a minha vida? Por que eu preciso tanto dessa exposição? Por que eu preciso das curtidas e comentários? Por que eu tento sempre provar que estou feliz? Por que eu faço de tudo para viver a vida que vá agradar aos outros e não a mim?


Um dia estaremos a sós com nós mesmos e, então, poderemos começar a viver a vida que nos pertence. Sem se preocupar tanto com o que pensam e com o que falam. Acho que felicidade começa assim. Começa quando deixamos de buscar aprovação dos outros e passamos a estreitar nossa relação com a nossa consciência. Assim vamos percebendo que felicidade não tem ligação com o crush, com o corpão, com a malha cara... Felicidade é algo mais sutil. Não tem forma, não tem rosto, não tem preço (e não requer mega exposição, muito menos "curitdas" alheias).

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

O Espelho Me Disse

(by Cinthya)

Lara sempre teve sua imagem associada a um belo sorriso, uma boa companhia, profundas gargalhadas e leveza. Creio mesmo que era um dom que ela tinha essa capacidade de dar leveza à tudo. Por muitas vezes, quando algum problema me tirava o sono e criava em meu estômago aquela inquietação, eu procurava a Lara para conversar. E, era incrível, como ela conseguia fazer-me crer que aquele problema imenso não era nada mais que um pequeno contratempo e que muito facilmente poderia ser solucionado.

Ela era o tipo de pessoa que não se apegava à dor, pelo menos não da forma que nós mortais, costumamos no apegar. Lara entendia a dor como algo até mesmo belo. Dizia que “a dor lapida a alma” e por isso era indispensável para nós, seres em evolução. Porém, não era preciso ver a dor como essa coisa monstruosa que nos definha. Não. A dor não precisava ser vista assim.

Reclamar da vida? Nunca ouvi reclamações vindas da Lara. Ela sempre tinha um pensamento que vestia lógica na situação conturbada que vivenciava. Os fatos atuais eram a colheita de um plantio pretérito. E se tinha algo que Lara fazia com muita precaução era justamente esse plantio. Escolhia à dedo as sementes a serem plantadas, pois gostava de harmonia e sorrisos. Lara era incrível!

Aprendi com ela que existem outras infinitas formas de ver uma situação. Aprendi que não sou o centro do universo, que meu problema não é maior do que o seu que me lê nesse momento, por exemplo. Lara me fez entender a responsabilidade que tenho com a minha vida. Que reclamar dos meus problemas não os resolverá, muito pelo contrário, só acentuará e intensificará sua ação sobre mim.

Por muitas vezes me perguntei “será que ela é desse mundo?”, pois sempre achei incrível a forma que ela tinha de encarar a vida. A disponibilidade em ajudar, em escutar, em abraçar, em silenciar, em amar.  Lara ensinava pelo exemplo. Jamais se perdeu naquela coisa de “faça o que eu digo e não faça o que eu faço”. Lara se empenhava em ser reta. Acreditava na vida. Sorria pra vida. E a vida sorria pra ela.

Sinto saudade da Lara. Sinto muita saudade dela. Quando vejo os problemas se agigantando, paro e penso em tudo o que ela me ensinou. Procuro rápido um outro ângulo para enxergar a situação antes que o desespero apareça. Antes de tratar alguém, penso como eu gostaria de ser tratada, lembro da reciprocidade tão peculiar à Lara, lembro da empatia que fazia dela um ser tão iluminado. Lara sempre soube sentir a dor do outro.

Hoje parei em frente ao espelho enquanto fazia minha maquiagem, mirei meus olhos para acertar o traço do lápis e, por um instante, percebi que ela ainda estava lá. Por um instante ainda ví aquele brilho. E ouvi mesmo ela sussurar com aquela voz tão doce “não esqueça que eu sou você. Se não está me vendo, já sabe o que fazer, né? Muda o ângulo!”.


Sorri. Ressurgi. Segui.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016


À sombra do medo
(by Cinthya)

Estava no meu trabalho, quando o celular toca e vejo o nome da pessoa que faz o transporte escolar do meu filho. Isso já foi o bastante para que eu sentisse a presença de um frio na barriga. Olhei para o relógio, era meio-dia, atendi a ligação já me sentindo suspensa do chão. Queria ouvir tudo, menos o que eu ouvi: “Cinthya, eu não encontrei o Pedro na escola. Procurei em todos os locais e não o encontrei.”

Eu desliguei o telefone e já não consegui processar muita coisa, levantei para tentar ligar para o meu irmão que seria a pessoa mais próxima geograficamente da escola naquele momento.  Não lembrei o número dele na hora, não lembrei como captar linha para fazer a chamada. Eu já não raciocinava. Consegui. Controlei o choro e a voz, para não assombra-lo e contei sobre a ligação. Antes que eu pedisse, ele já disse: “Estou indo lá agora!”

Lembrei-me de outra mãe de um coleguinha do meu filho que busca o filho na escola. Consegui falar com ela e contei o que estava acontecendo. Ela estava chegando no colégio e já se empenhou em procura-lo também. Eu chorava, e ficava tentando pensar na possibilidade de ser apenas algum mal entendido e que logo se resolveria. Mas o pensamento de “’ele’ pegou meu filho também!” era mais forte.

Nesse tempo, eu ligava para a escola e não atendiam. Como trabalho na zona rural, tive medo de me deslocar pra lá e ficar sem sinal telefônico por um tempo. Daí a pouco a mãe do coleguinha dele me liga pra dizer que o filho dela falou que o Pedro sentiu dor na garganta e depois do recreio não voltou pra sala. Ela já desesperada disse para eu ir pra escola.

Depois que eu ouvi isso, não ouvi mais nada. A parede me segurou e eu senti a maior dor do mundo até então. Por que eu só pensava o pior. Coloquei meu rosto entre as mãos e disse: “Pai, o Senhor quis levar meu filho?”. E eu chorei, meu corpo sacudia.

Nesse tempo, o meu irmão estava já na coordenação da escola, quando foi informado que “a mãe” do Pedro o havia levado. Ele se desesperou mais ainda. E já ia tomar outras medidas quando verificaram direito e viram que a avó o havia buscado.

Meus amigos do trabalho já estavam me conduzindo ao carro para me levar até a cidade, até a escola, e eu tentava expulsar da mente a imagem do meu filho com uma fraca cravada nele, dentro de uma sala abandonada. Foi quando meu celular tocou e era a minha mãe dizendo que a escola havia ligado pra minha casa porque o Pedro não estava passando bem, e minha mãe foi busca-lo, esquecendo-se de avisar ao responsável pelo transporte e a mim.

Em outros tempos, eu teria raciocinado e iria supor que, se ele estava doente e saiu da sala, a escola teria ligado pra minha residência e minha mãe teria ido busca-lo, como já aconteceu outras vezes. Porém, depois da noite de 10 de dezembro de 2015, eu não tenho mais paz em nada relacionado à segurança do meu filho. Eu vejo o carro do transporte escolar sumir na esquina e oro a Deus para que meu filho volte pra mim, vivo, bem e feliz como deve ser toda criança.

Por cerca de 20 minutos, não sei bem quanto tempo durou aquela agonia, eu provei o sabor horrível do medo, da impotência e do desespero.

Não há um dia, nem uma tarde, nem uma noite na minha vida desde aquele fatídico 10/12/2015 que eu não me coloque no lugar da mãe de Beatriz. Não há um único dia que eu não ore por aquela família, que eu não sofra imaginando a dor que é tudo isso.

O que eu vivi foi resolvido em 20 minutos e não passou de informações desencontradas. Infelizmente com a Beatriz não foi assim. O que a família vem passando, se arrasta por 74 dias e as repostas não chegam.

Estamos todos vulneráveis. Estamos todos expostos. Aconteceu com a família do professor Sandro, pode acontecer com a minha, com a sua família. Pode acontecer com o seu vizinho, com seu primo ou tio. Pode acontecer com seu amigo. Pode acontecer com o meu filho, com o seu filho.

A falta de resposta no caso de Beatriz tem um impacto muito grande na sociedade. Eu, pelo menos, vivo assombrada, não tenho paz, vivo numa ansiedade doentia, um medo constante, uma sensação horrorosa de que a qualquer momento meu telefone poderá tocar me trazendo notícias que eu nunca quero receber. E isso não é vida. E isso não é drama e nem exagero meu. O meu filho também tem sete anos, também nasceu em fevereiro de 2008, também estuda numa escola de base religiosa, também é dócil. Se aconteceu com Beatriz, pode acontecer com Pedro ou com qualquer outra criança.

Nós temos um(a) assassino(a) muito perigoso solto e impune na nossa sociedade. E isso, por si só, já tem nos matado aos poucos.

Não é possível que num evento com tantas pessoas, NINGUÉM tenha visto nada. Não é possível isso. Pelo amor de Deus, não tenham medo de denunciar. Veja a responsabilidade que é poder contribuir com a solução desse caso e não o fazer. Não espere acontecer de novo. Denuncie.

Como disse o Prof. Sandro, nada vai trazer Beatriz de volta. Mas as autoridades competentes devem a esses pais a solução desse caso. Devem à sociedade a solução desse caso. Se não foi possível oferecer a segurança preventiva, que não meçam esforços em identificar, encontrar e deter esse assassino(a).

Não esperem acontecer de novo. Pelo amor de Deus, não esperem acontecer de novo.