(by Cinthya)
Durante e minha gestação, era normal eu ter crises e mais
crises de choro. Um choro que não sei bem de onde vinha, mas vinha. E vinha com
força total. Eu chorava copiosamente, desesperadamente, sentidamente,
profundamente. Muitas dessas crises (ou quase todas) aconteciam no meu
trabalho, durante o expediente, e uma amiga que trabalhava comigo era sempre
quem vinha me socorrer. Ela não sabia o que falar e chorava junto comigo.
Ficávamos as duas ali a chorar. Era o jeito que ela tinha de dizer que estava
ao meu lado, acontecesse o que acontecesse.
Também foi ela que me consolou quando uma médica (por
telefone) ao saber o resultado de um exame meu disse-me que eu provavelmente
perderia o meu filho. Eu quase não conseguia levantar da cadeira, mas a minha
amiga me ajudou e foi comigo a pé, durante o trajeto que fazíamos todos os dias
até o ponto de ônibus, tentando me acalmar, tentando conter meu choro, tentando
cassar o diploma da tal médica, enfim.
Essa minha amiga foi quem saciou um desejo que eu tive,
enquanto grávida, de comer pizza de calabresa. Ela comprou a pizza e preparou
uma linda mesa na casa dela para me receber. Eu sabia que ela estava super
apertada financeiramente e que tirara aquele dinheiro com o qual comprara a pizza de
alguma conta que precisava pagar. Mas ela fez isso pra me ver feliz.
Quando ela casou eu não pude ir, pois meu filho tinha poucos
meses de vida e a cerimônia aconteceu em outra cidade. Fiquei imensamente feliz
com a realização desse sonho que ela tinha, que era o de casar. Estávamos as duas com
nossos sonhos, radiantemente, realizados.
O tempo passou e ela, sempre louca por crianças, enfim
engravidou. E eu chorei de alegria quando recebi a notícia. E espalhei pelos
quatro cantos a novidade! Todos os amigos ficaram felizes com a boa nova! Todos
ligando para parabenizá-la.
Nos últimos exames foi detectado um problema no coração do
bebê. Acreditamos que tudo ia se resolver, que tudo não passava de um susto.
Que ele seria submetido a cirurgia e ficaria bem. E cresceria e daria aos pais
a satisfação de ter um filho, de acompanhar um filho.
Muitas vezes de nada adianta os nossos planos, a nossa
vontade. Algumas vezes a vida toma o rumo que quer tomar, sem se preocupar com
o que queremos que aconteça. E minha amiga viu o seu filho partir, ali, na sua
frente, depois de lutar pela vida com uma garra que poucos adultos têm. Ela sequer pôde segurá-lo nos braços, sequer pôde levá-lo ao seio. Só pôde vê-lo ali, na UTI, lutando para ficar.
E como é doído ver uma pessoa amada sofrer como ela está
sofrendo. E como dilacerou meu coração preparar a mesa para que pudéssemos
colocar o caixão com o corpinho dele. E como arrasou comigo ver a minha amiga e
o marido, sentados ao lado do pequeno corpo, contornando cada traço delicado do
rostinho dele.
Eu não pude fazer nada. Nada que eu fizesse aliviaria a dor
que ela sentia, que ela sente. Mas eu segurei-lhe a mão. Eu não pude arrancar a
dor do coração dela. Não tive como reescrever esse capítulo da história. Não
consegui dar um outro rumo às coisas. Nada disso eu consegui fazer. E fiquei
ali a chorar a dor que a consumia. Agarrada em sua mão, ao seu lado.
O que eu posso fazer é estar com ela, aconteça o que
acontecer.
Nós demos muitas gargalhadas juntas e hoje choramos juntas
muitas lágrimas. E vêm e vão-se as lágrimas e as gargalhadas, mas o amor está
sempre firme entre a gente. O luto dela é meu luto. A dor dela é minha dor.
Amizade é isso. Amor é isso.
PS: Nem sei se esse texto terá algum sentido pra quem o ler...
Mas eu não conseguiria escrever sobre outra coisa... Porque eu não consigo
sentir outra coisa.
Um comentário:
Cinthya, gosto muito dos seus textos, me animam. Falam muito de sua partcicipação no grande debate que haverá durante o evento '' JOAQUIM, TEREZA E O JUMENTO '', do professor Otoniel Gondim. Gostarei de vê-las debatenbdo. Admiro as duas e vão alçar vôos. Até lá. Dia 14 de junho. restaurante Devassa.
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