(by Cinthya)
A vida dispõe de mecanismos diversos para fazer pessoas se encontrarem, conversarem, se ajudarem. Do nada surgem oportunidades que a gente abraça e que nos levam para outros ares, para conhecer pessoas diferentes. E cada pessoa é um mundo. Cada um traz em si um mundo de defeitos e qualidades, de perdas e ganhos, de lutas e calmaria. Cada um com o seu valor, com o seu sorriso e com a sua dor.
Fazendo uso de um desses mecanismos a vida me levou para uma cidade pequena, para ministrar aulas em curso profissionalizante para jovens e adultos. E em uma das turmas, uma aluna, ao terminar a aula, se aproximou de mim e pediu um tempo para conversarmos. Ela trabalha com o pai numa loja e queria alguns conselhos sobre um relatório que o pai havia solicitado e que ela não sabia como desenvolver.
Eu desenhei um esboço do que seria esse relatório e ela prestou atenção. Ao final ela disse que tinha começado a escrever algo, mas que era bem diferente do que eu estava fazendo, e me mostrou “o relatório”. À medida que ela lia, os lábios tremiam e as palavras quase não saiam. O pai pedira para ela fazer um relatório sobre o objetivo dela na empresa e o que, de fato, ela estava fazendo (pois ele acredita que ela não está rendendo o que ele esperava). Mas o que ela passou para o papel foi um acervo de sentimentos de uma filha de pais separados que luta todos os dias para ganhar o carinho e a admiração do pai que sempre foi ausente na sua vida.
Em certo momento eu perguntei : “Vocês nunca se abraçaram?” E ela desatou num choro tão sentindo e tão profundo que eu quase fico atônita. E disse que em toda a sua vida, apenas uma vez o seu pai a abraçou. Uma única vez e que seu coração ficou pequeno nessa hora, que ela nunca esqueceu esse dia. Ela disse que imagina e sonha como seria bom se ele fosse realmente um PAI pra ela, que se preocupasse, brigasse, protegesse. E olhou pra mim e disse: “Professora, como é ter um pai?”
Tinha tanto sofrimento naquele olhar, tanta amargura e tanta solidão. Ela falou que tem mais cinco irmãos por parte de mãe (com pais diferentes) e cinco por parte de pai (com mães diferentes). Disse que se sente perdida em meio aos erros dos pais e que, no final das contas, ela ficou sem carinho de um e de outro. E luta desesperadamente pelo direito de ter um pai.
“Se um dia ele disser ‘ eu te amo’, vou chorar tanto agradecendo a Deus, porque eu acho muito lindo essa frase ‘eu te amo’ e sempre sonhei com o meu pai dizendo isso pra mim, mas não sei se vou conseguir.”
Essa menina tem dezessete anos e traz tanta amargura no peito que me deixou sensibilizada. Ao término de nossa conversa ela disse que estava se sentindo melhor pelo simples fato de ter desabafado. E eu disse para ela não ter medo, ir fundo no objetivo dela. Que fizesse a carta, que fosse sincera, que deixasse a emoção sair e se transformar em palavras. E que, não temesse, chegasse e desse o primeiro passo. Abraçasse o pai, e não se sentisse mal caso ele não retribuísse o abraço de imediato. Mas que esse abraço se tornasse uma rotina até ele se render. Pois um abraço sincero e cheio de amor quebra qualquer reação, qualquer dureza, qualquer gelo.
Que os pais tenham mais responsabilidades com os filhos. E eu não falo da responsabilidade material, mas que sejam responsáveis pelo emocional de seus filhos. É obrigação de pai e de mãe, abraçar e beijar sua prole, indiferente de viverem juntos ou separados. Todo filho tem o direito de ouvir dos seus pais ‘eu te amo’, porque é muito triste ouvir uma menina de dezessete anos, tão bonita e com uma vida toda pela frente, que convive diariamente com o genitor, olhar pra mim, chorando, e perguntar: “Como é ter um pai?”
Um comentário:
Oi Amada!
Realmente, uma história triste demais a dessa moça. O seu conselho foi perfeito e espero que tudo dê certo na vida dela.
Beijos,
Selma.
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