domingo, 29 de abril de 2012

Apenas Uma Segunda-feira


(by Cinthya)

Algumas vezes eu me inquieto. Sinto crescer em mim um vazio que consome a alma e deixa turva a minha paz. Revira sentimentos, assola certezas e traz o caos. Daí eu busco a tábua de salvação que possa me dar um pouco de ar respirável.

E, revirando minha estante encontrei nela o Neruda que você me deu. Um pouco empoeirado, um tanto amarelado. Abri-o e lá estava a sua letra, o seu poema improvisado, o seu português imperfeito. Com o Neruda nas mãos revivi momentos nossos, passados, guardados numa área vip das minhas lembranças.

"O pai destino voltará a juntar-nos novamente.
Não me esqueça!!!"

Eu não esqueci. A alma não esquece os dias de gozo no paraíso. A alma nunca esquece.

Walking Around

(Pablo Neruda)


Acontece que me canso de ser homem.
Acontece que entro nas alfaiatarias e nos cinemas
Murcho, impenetrável, como um cisne de feltro
Navegando numa água de origem cinza.



O cheiro das barbearias me faz chorar aos gritos.
Só quero um descanso de pedras ou de lá,
Só quero não ver mais estabelecimentos ou jardins,
Nem mercadorias, nem óculos, nem elevadores.



Acontece que me canso dos meus pés e das minhas unhas
E do meu cabelo e da minha sombra.
Acontece que me canso de ser homem.



No entanto seria delicioso
Assustar um notário com um lírio cortado
Ou dar a morte a uma freira com um golpe de orelha.
Seria belo
ir pelas ruas com uma faca verde
e dando gritos até morrer de frio.



Não quero continuar sendo raiz nas trevas,
Vacilante, estendido, tirando de sono
Para baixo, nas tripas molhadas da terra,
Absorvendo e pensando, comendo cada dia.



Não quero para mim tantas desgraças.
Não quero continuar de raiz e túmulo,
De subterrâneo solitário, de adega com mortos,
Transido morrendo de pena.



Por isso a segunda-feira arde como o petróleo
Quando me vê chegar com a minha cara de cárcere,
E uiva no seu transcurso como roda ferida,
E dá passos de sangue quente para a noite.



E me empurra para certos recantos, para certas casas úmidas,
Para hospitais de onde os ossos saem pela janela,
Para certas sapatarias com cheiro de vinagre,
Para ruas horríveis como gretas.



Há pássaros cor de enxofre e horríveis intestinos
Pendurados nas portas das casas que odeio, há
Dentaduras esquecidas numa cafeteira,
Há espelhos,
Que deviam ter chorado de vergonha e espanto,
há guarda-chuvas por todas as partes, e venenos e umbigos.



Eu passeio com calma, com olhos, com sapatos,
Com fúria, com esquecimento,
Passo, cruzo escritórios e lojas de ortopedia,
E pátios onde há roupas penduradas num arame:
Cuecas, toalhas e camisas que choram
Lentas lágrimas sujas.

4 comentários:

Van disse...

Cy ! Minha lindona ! Saudade que eu tô daqui , de você e da Vevel ! Menina e que brinde esse seu texto da segunda-feira , perfeito para o dia de hoje que nos remete a reflexões ! Vê se não some dos Meus Escritos !

Beijão !

Van disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Debby disse...

Nossa CY
Neruda tem seu lugar não é??
Você já leu não estou preparado para te esquecer ???
Perfeito.. e a ousadia aqui fez um dueto com ele pode? rsr
É isso ai amiga viva mas intensamente e tudo que tiver que viver e que a saudade permitir.
Bjs no coração
Debby :)

Anônimo disse...

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